S.O.S. infância
Nos últimos anos, tem aumentado no Brasil os casos de suicídios entre crianças e adolescentes. Conheça algumas das razões e o que fazer para evitar
A cada 40 segundos uma pessoa se suicida no mundo, o que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), soma quase 800 mil indivíduos por ano. Só no Brasil, pelos dados do Ministério da Saúde (MS), entre 2011 e 2015, foram registrados no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) 55.649 óbitos por suicídio, com uma taxa geral de 5,5 casos a cada 100 mil habitantes, variando de 5,3 em 2011 a 5,7 em 2015.
Dentro desse universo, um índice que tem causado cada vez mais preocupação é o relacionado a crianças e adolescentes. Para se ter uma ideia, quase duas pessoas com idade entre 9 e 18 anos consumaram suicídio por dia no País, em 2013. Em praticamente todas as idades, as taxas aumentaram entre 2003 e 2013 – em 2003, na faixa de 9 a 19 anos era de 1,9 em 100 mil; em 2013, elevou-se para 2,1.
Estes números fazem parte do estudo Violência Letal contra as Crianças e Adolescentes do Brasil, realizado pelo sociólogo e coordenador da Área de Estudos da Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Julio Jacobo Waiselfisz.
Se relacionado com outras nações, os indicadores brasileiros até que não são os maiores – o Brasil ocupa a 43ª posição em um ranking de 89, com taxa de 0,7 suicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes de 10 a 14 anos de idade; a 51ª posição entre os adolescentes de 15 a 19 anos, e a 53ª no conjunto de 10 a 19 anos de idade. O problema é que eles estão crescendo lentamente ao longo do tempo.
Mas o que leva alguém, com tão pouca idade, ao ato desesperado de tirar a própria vida? É complicado dar uma resposta direta, pois são muitos os fatores envolvidos, tais como depressão, ansiedade, bullying, dificuldade para lidar com frustrações, pressões sociais, questões sobre a sexualidade e redes sociais. O psicólogo, especialista em Medicina Comportamental e hipnoterapeuta, Valdecy Carneiro, comenta que a falta de propósito é outro ponto que precisa ser levado em consideração.
Sinais de alerta
– Isolamento social grande, seja com a família ou os amigos;
– Diminuição do autocuidado e descuido com a aparência;
– Mudança repentina de humor;
– Aparecimento ou agravamento de problemas de conduta ou de manifestações verbais durante pelo menos duas semanas;
– Preocupação com a própria morte ou falta de esperança;
– Expressão de ideias ou intenções suicidas;
– Abuso no consumo de substância lícitas ou ilícitas, e
– Automutilação (se machucar propositalmente).
Fonte: Ministério da Saúde
“A criança e o adolescente, hoje em dia, têm de lidar com as altas expectativas dos pais, especialmente nas famílias com melhor posição sócio-econômica. Eles são pressionados o tempo todo a ter um excelente desempenho escolar e a fazer mil e uma atividades, mesmo que não queiram. Muitos, inclusive, têm uma lista de afazeres bem mais extensa do que os adultos. Com isso, chegam num ponto em que perdem o propósito e acabam vivendo para atender aos anseios dos outros e se tornando cada vez mais escravos de uma rotina atribulada e indesejada”, analisa.
O especialista ainda pontua que esta turma tem sofrido com a sensação de não pertencimento. “Diversas crianças e adolescentes sentem que não se encaixam em lugar nenhum e que não servem para nada, não têm identidade. Situação que só piora com a cobrança exercida pelos responsáveis por boas notas, bons comportamentos, bons amigos.”
Para Waiselfisz, os conflitos que surgem conforme a sociedade se desenvolve também merecem destaque. “À medida que ela avança, é normal que as pessoas, inclusive as crianças e os adolescentes, tenham dificuldade em entendê-la e vice-versa. Isso cria uma crise pessoal grande e pode culminar no suicídio.”
O que fazer?
Lidar com todas essas questões não é tarefa fácil, mas é possível. Apesar de o suicídio ser, como define o Ministério da Saúde, “um fenômeno complexo, multifacetado e de múltiplas determinações, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, classes sociais, idades, orientações sexuais e identidades de gênero”, ele é prevenível.
Para isso, Carneiro recomenda atenção. “É fundamental perceber a criança ou o adolescente, ou seja, olhar para ele com cuidado e, a qualquer indício de mudança comportamental, conversar de forma sincera, apoiar e buscar ajuda.” Junto a isso, o psicólogo indica ficar de olho nas redes sociais dos filhos: “Não é para invadir a privacidade, mas sim observar o que acontece nesse mundo potencialmente perigoso”.
Também é necessário não julgar e, em casos de transtornos mentais, não estigmatizá-los e nem ignorá-los. E não são apenas os familiares que têm a obrigação de auxiliar nesta situação. A escola tem um papel muito importante. Entre as ações que podem e devem tomar estão discutir com os alunos e seus familiares o suicídio e temas relacionados, como problemas emocionais; criar comissões para tratar o bullying; trabalhar ao máximo a cultura da aceitação – de si mesmo e dos outros –; e promover atividades que desenvolvem habilidades socioemocionais.
Onde buscar ajuda
– Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e Unidades Básicas de Saúde (UBS);
– Unidade de Pronto Atendimento (UPA), SAMU, pronto-socorro e hospitais, e
– Centro de Valorização da Vida (CVV).
Fonte: Ministério da Saúde