Grandes empresas, pequenos negócios
Redes de franquias tradicionais lançaram formatos de microfranquias para se adequar à grande demanda do mercado
A pandemia de coronavírus obrigou empresas de diversos segmentos e tamanhos a se reinventarem, e no franchising não foi diferente. Diante de um cenário tão desafiador, as redes desse sistema precisaram fazer diversas mudanças e, sobretudo, investir em novos formatos para se manterem ativas e atrair investidores.
Paras muitas delas, a solução foram as operações mais enxutas e baratas. Assim, ganharam destaque as microfranquias, com investimento inicial abaixo de R$ 90 mil. Esse modelo de negócio, que vem numa crescente na última década e deverá seguir em forte alta este ano, caiu nas graças até de marcas tradicionais.
É o caso da Calçados Bibi. Com o objetivo de potencializar a sua presença, a empresa que atua desde 1949 no segmento infantil estruturou, em julho do ano passado, um modelo mais econômico, de R$ 90 mil. Ele contempla instalações, soluções tecnológicas, primeiro estoque, capital de giro e taxa de franquia. O faturamento médio mensal estimado é de R$ 40 mil e, o prazo de retorno, de 12 meses.
Para efeito de comparação, os outros modelos oferecidos pela rede são a Loja Padrão e a Loja Light, cujos investimentos totais (já incluindo taxa de franquia, showroom e capital de giro) são de R$ 580 mil e R$ 300 mil, respectivamente, com faturamento médio mensal entre R$ 100 mil e R$ 160 mil e entre R$ 70 mil e R$ 100 mil.
“O grande diferencial da microfranquia é ingressar em lojas que contam com um mix de produtos infantis. Nelas, há um espaço reservado apenas para os calçados da Bibi e o logo da marca é inserido na fachada da unidade. Para agregar ainda mais, o negócio passa a contar com todo o nosso sistema de gestão e os projetos de transformação digital, que auxiliam de forma efetiva no aumento das vendas”, comenta a presidente da companhia, Andrea Kohlrausch.
O formato é parecido com o licenciamento, com a vantagem de que o franqueado recebe todo o suporte da franqueadora, além de se tornar um embaixador da marca na cidade. O novo projeto foi pensado, principalmente, para municípios menores, com até 100 mil habitantes, e que não contam com shopping centers. Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, foi o primeiro a recebê-lo. Para 2021, a meta é abrir dez pontos.
Há 48 anos atuando no segmento educacional, o CNA também abraçou o modelo de microfranquia para melhorar seus resultados. Em fevereiro deste ano, a rede lançou dois modelos: Franquia Escola CNA e Franquia Studio CNA. Ambos têm valor inicial de R$ 35 mil.
“Atuamos para responder aos estímulos e mudanças do mercado em alinhamento com as rápidas transformações. Percebemos a necessidade e a oportunidade como uma tendência e nos movimentamos rapidamente para reagir a isso com esses novos formatos de franquia que passamos a comercializar”, destaca o diretor de Expansão da empresa, Eduardo Murin.
A Franquia Escola CNA foi pensada para ser instalada dentro de instituições de ensino, e tanto para quem já é franqueado da rede quanto para mantenedores de colégios. A Franquia Studio CNA, por sua vez, foi idealizada para cidades com até 35 mil habitantes e prevê um ponto comercial com uma sala de aula, em espaço econômico com até 40 m². Nela, o franqueado precisa ser, necessariamente, professor de inglês, espanhol ou dos dois idiomas.
Além dos dois lançamentos, a rede continua trabalhando com seus outros quatro modelos (compacto, pequeno, médio e grande), com investimento entre (a partir de) R$ 95 mil e (a partir de) R$ 350 mil. Atualmente, são 630 escolas em operação e o plano de expansão para 2021 prevê a abertura de mais 165 em todas as regiões do País, com ênfase no Norte e no Sul e nos estados de Minas Gerais e Bahia.
Para o fundador da Loja de Franquia, Lucien Newton, a microfranquia resgata muito dos primórdios do franchising, da sua essência. “É um modelo que surgiu forte na década passada e ganhou relevância com a pandemia. O que aconteceu é que a atual crise forçou as empresas a buscarem alternativas de expansão e com custo reduzido. Ficou claro que esse é o caminho, até porque é um tipo de negócio eficiente, inteligente e, muitas vezes, flexível. Não à toa tem sido adotada por grandes franqueadoras, marcas consagradas, como estratégia de sobrevivência.”
Junto com a necessidade de se diminuir os custos e dar continuidade ao negócio, outro importante impulsionador das franquias mais enxutas tem sido oferecer uma oportunidade para o pequeno empreendedor. “Em outros momentos de dificuldade econômica, o mercado de franquias recebeu profissionais em busca de alternativas de renda, é o conhecido empreendedorismo por necessidade. Agora, algumas redes têm nos relatado esse maior interesse, especialmente entre as microfranquias”, aponta a diretora de Relacionamento, Microfranquias e Novos Formatos da Associação Brasileira de Franchising (ABF) e sócia-diretora da microfranquia Nutty Bavarian, Adriana Auriemo.
Segundo ela, são dois perfis principais: os profissionais que perderam o emprego e com o dinheiro da rescisão decidem investir e pequenos empresários que aproveitam a queda dos preços dos aluguéis e a baixa dos juros para abrir novas frentes. “Em menor quantidade, temos ainda franqueados que expandem suas operações e investidores em busca de diversificação de seus ativos”, acrescenta.
Todo mundo de olho
Em 2020, segundo dados da ABF, operavam no País 562 redes com modelo de microfranquia, sendo 63% puras (apenas com este modelo). Este ano, espera-se que o número seja ainda maior, e não só pela entrada das marcas tradicionais, mas também das mais novas.
Lançada em 2014, a Bubble Mix Tea, rede de preparo da bebida taiwanesa Bubble Tea, é uma delas. Antes da pandemia, cerca de 85% de suas unidades ficavam em shoppings e galerias comerciais, locais que tiveram de ser fechados várias vezes desde março do ano passado, o que impactou fortemente no faturamento.
“Por conta disso, pensamos que precisávamos de um modelo de negócio voltado para a rua e preferencialmente mais barato. Criamos, então, o To Go e o Express. O To Go é focado no take away. Tem um cardápio bem objetivo, com a novidade de o franqueado também poder vender produtos alimentícios para complementar o portfólio, e funciona em espaços compactos, a partir de 4,5 metros. O Express é uma store in store, idealizada para ser uma operação reduzida dentro de um estabelecimento já existente”, conta o sócio-diretor da empresa Rogério Arcanjo.
O primeiro formato tem investimento inicial de R$ 85 mil, incluindo taxa de franquia, maquinário básico e kit de utensílios, com projeção de faturamento mensal entre R$ 20 mil e R$ 40 mil. Até abril deste ano, sete unidades haviam sido vendidas e a meta é chegar a 20 em dezembro. No segundo, o valor é de R$ 25 mil, com faturamento médio mensal entre R$ 10 mil e R$ 25 mil. As vendas até o momento somam 11 operações, devendo a chegar a 35 nos próximos seis meses.
Com as novidades, a empresa agora conta com quatro formatos de franquias. Os outros dois são loja e quiosque padrão, cujos investimentos iniciais ficam entre R$ 155 mil e R$ 180 mil, e o faturamento médio mensal, entre R$ 40 mil e R$ 75 mil. O payback estimado é entre 18 a 30 meses.
A rede de cuidadores de pessoas Home Angels, apesar de já ter nascido como microfranquia, em 2009, também decidiu criar uma opção mais econômica para captar interessados e conseguir se manter durante a maior crise sanitária da história. “A pandemia nos fez ter a necessidade de criar um modelo específico para pequenas e médias cidades. Assim nasceu o Home Angels Express, focado apenas em cuidadores de idosos e na oferta de serviços com uma carga horária menor, com contratos de quatro horas”, diz o sócio-diretor da marca Artur Hipólito.
O lançamento tem taxa de franquia entre R$ 25 mil e R$ 35 mil e investimento pré-operacional de cerca de R$ 16 mil. O modelo tradicional ofertado pela marca, o Premium, tem taxa de franquia entre R$ 35 mil e R$ 50 mil e investimento de aproximadamente R$ 39 mil. Atualmente, a Home Angels conta com 105 unidades ativas. Com o Express, o plano é dobrar de tamanho até meados de 2022.